Goiabeira não combina com sandália

Há mais de 15 anos, a goiabeira estava lá, bem na esquina do bloco A, da CLS 407. Não agredia, não impedia a passagem de homens, mulheres, velhos e crianças. Nem era um obstáculo para os cadeirantes. E, de lambuja, generosamente, oferecia frutos gratuitamente a quem desejasse degustá-los. Mas se antepôs diante da fachada de uma poderosa loja, revenda de uma marca muito popular de sandálias.
E não é que a goiabeira, mais antiga que a loja e anterior à invenção da popular sandália, começou atrapalhar os negócios. Como isso é possível? Ainda não se sabe. O que se percebe é que goiabeira e sandália ou sandália e goiabeira, ao menos, para alguns não combinam.
A ousada goiabeira ignorou a loja, que chegou ao local bem depois dela, e não inibiu o crescimento dos seus galhos, que teriam ficado entre a visão de potenciais clientes e o imenso painel que identifica o produto à venda. Taí, o motivo de a goiabeira e a loja não combinarem. Então, chegou a hora da goiabeira ser radicalmente punida. Ou, quem sabe, torturada. Os galhos abusados foram amputados. Óleo combustível queimado foi derramado sobre o tronco.
Agora, sim. Começou a punição: a morte será lenta. A goiabeira conhecerá a capacidade de uma pessoa ser cruel. Não que o algoz tenha prazer com esse gesto. O ideal mesmo seria guilhotinar a goiabeira com um só golpe. Mas isso chamaria por demais a atenção daqueles que ainda são sensíveis e rechaçam os atos violentos.
Matar a goiabeira sorrateiramente, sem alarde, seria a melhor a estratégia para ocultar o infrator da Lei nº 9.605/98, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. Em seu artigo 49, a lei tipifica como crime culposo, com pena de um a seis meses, quem “destruir, danificar, lesar ou maltratar, por qualquer modo ou meio, plantas de ornamentação de logradouros públicos ou em propriedade privada alheia”.
A estratégia de eliminar a goiabeira sem estardalhaço segue em curso. Ninguém apura quem foi arrancou os galhos da goiabeira. Há suspeitas e elas recaem sobre o mais interessado no desaparecimento da goiabeira, provavelmente o dono da loja ou de um empregado bajulador, que não quer ver o patrãozinho aborrecido.
Cadê as autoridades? Mais uma vez vão ignorar a lei? Hoje é a vez da goiabeira. Amanhã será outra árvore. Depois, outra e mais outra. O verde vai perdendo espaço para interesses que não correspondem aos da comunidade. A lei não cumprida. As árvores ficam subjugadas a interesses econômicos. E não como deixar de perguntar: Cadê a autoridade? Vamos regar a impunidade, para que ela prospere e faça brotar todas as espécies de crimes, até os ambientais? Da omissão não se pode esperar outros frutos que não sejam violência e impunidade.

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