Chega de sabotagem

Rosane Garcia
Por meio de sucessivas reportagens e de duas campanhas em meio virtual — #vaitrabalhardeputado e #tomavergonhadeputado —, que angariaram expressivo apoio dos leitores, foi possível reverter espúrios processos em curso na Câmara Legislativa, que afetavam negativamente a vida dos brasilienses, estragulavam a possibilidade de participação do cidadão e blindavam os parlamentares corruptos das sanções legais, a começar pela perda do mandato. Em síntese, as ações coroavam a impunidade e excluíam o Distrito Federal dos avanços democráticos, pelos quais os eleitores têm, cada vez mais, voz nos processos decisórios sobre as  políticas públicas direcionadas ao desenvolvimento socioeconômico das cidades.
Embora forçados a recuar, diante da pressão popular, os deputados distritais não cessam de conspirar contra a sociedade brasiliense. Agora, um grupo deles articula a votação de uma versão da Lei de Uso e Ocupação do Solo (Luos), uma das muitas aberrações produzidas pelo Poder Público local, que desfigura completamente as proposições técnicas para, como sempre, fazer prevalecer interesses empresarias contrários ao bem-estar da coletividade. A maioria da população sequer tem conhecimento sobre os impactos da norma. As audiência públicas tiveram uma divulgação pífia e não atraíram número expressivo de cidadãos.
Muitas áreas que guardam relevantes estratos do patrimônio ambiental, extremamente importantes para a qualidade de vida no Distrito Federal, estão ameaçadas pela Luos. Ao longo dos anos, muitos dos danos ambientais decorreram do avanço da especulação imobiliária, amparada na negligência e conivência dos governantes, frente às ocupações indevidas do solo.  O DF tornou-se vítima da cultura do fato consumado em detrimento dos aspectos legais.
Um dos reflexos da ocupação inadequada e ilegal do solo é o comprometimento da oferta de água. O Poder Público aponta como opções para o abastecimento os lagos do Paranoá e de Corumbá 4 — neste caso, as obras necessárias para importar água de Goiás para o DF têm um custo semelhante ou superior ao da hidrelétrica. Tais investimentos desviam recursos indispensáveis à saúde e à educação, que têm padrões muito aquém das exigências e necessidades de uma capital da República.
O que justifica, no entanto, colocar em votação uma lei tão polêmica ao apagar das luzes da atual legislatura, que será lembrada pela participação de vários parlamentares em escândalos rumorosos que envergonharam o DF frente às demais unidades da Federação? Dificilmente será impossível dissociar o ávido desejo dos parlamentares de votar a Luos de algum possível acordo, que favoreça grupos econômicos e que implica benefícios pessoais.

A parcela  dos distritais que goza de alguma sanidade deveria conter essa ânsia desmedida dos seus pares, pois a cidade está em frangalhos pela desgovernança dos últimos quatro anos. Assim, é de suma importância poupar o DF de mais golpes contra o patrimônio local, a cidadania e a qualidade de vida. Evitem que Brasília seja, mais uma vez, vítima de sabotagem ao apagar das luzes de 2014.

(Artigo publicado na edição de hoje do jornal Correio Braziliense// Foto: Internet)

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