A vida em jogo

Populações indígenas: vidas ameaçadas pela irresponsabilidade dos legisladores brasileiros
Rosane Garcia

Líderes de 196 países estão, desde segunda-feira, reunidos em Lima, capital do Peru, na 20ª Conferência Global do Clima. Estados Unidos e China recuaram de decisões anteriores e manifestaram previamente metas de redução das emissões de gases de efeito estufa nos próximos anos. Os fenômenos climáticos, que têm provocado milhares de mortes e danos materiais incalculáveis em diversos pontos do planeta, entre outros fatores, contribuíram fortemente para a quebra da resistência das nações com elevado grau de industrialização. Os governantes perceberam que o desenvolvimento econômico não pode conspirar contra a Terra, cujos sinais de exaustão são muitos fortes. Mais do que o desempenho desse ou daquele segmento produtivo, o que está em risco é a humanidade.

Nos últimos três anos, o Brasil tem enfrentado graves problemas com as alterações do clima. O Nordeste passou pela pior estiagem em seis décadas. Embora o drama tenha sido mitigado pelas políticas públicas, os produtores viram o rebanho ser dizimado pela falta de água. Em 2014, a população do Sudeste e do Centro-Oeste amargou a tradicional experiência do sertanejo. O colapso no Sistema Cantareira praticamente envergou a unidade da Federação mais rica do país e mostrou o impacto doloroso do desmatamento. O brasileiros foram surpreendidos com a seca da nascente do São Francisco.

Na terça-feira, no encontro em Lima, as diferentes situações ocorridas no Brasil ilustraram os debates sobre as transformações climáticas. Em meio às discussões, foi divulgado o estudo Carbono nas florestas da Amazônia: o pouco reconhecido papel dos territórios indígenas e áreas naturais protegidas, que deverá ser publicado na próxima edição da revista Carbon Manegement. Especialistas, entre os quais integrantes de várias organizações brasileiras, alertam que a proteção de 55% do carbono encontrado nessas áreas é essencial à estabilidade do clima global e à saúde dos ecossistemas. As principais ameaças, segundo eles, partem da mineração, do corte ilegal de madeira, das barragens e dos projetos agrícolas em nove países da Amazônia, entre os quais está o Brasil, com especial destaque.

No entanto, as incoerências, no país, brotam como erva-daninha. Quando este texto estava sendo elaborado, na Câmara do Deputados, os ruralistas — que compõem a bancada do atraso com as bênçãos dos empedernidos fundamentalistas — tratavam da aprovação da PEC nº 215, que retira do Executivo e transfere para o Legislativo a atribuição de demarcar e rever os limites das terras indígenas, dos quilombos e das áreas de  proteção ambiental, ou seja, as áreas que devem ser protegidas pelo relevante papel que desempenham no sequestro de carbono e no equilíbrio do clima. Essas reservas serão vítimas da irresponsabilidade de legisladores que mudam a Constituição de uma nação para legitimar a degradação do patrimônio ambiental e o genocídio de povos secularmente excluídos dos benefícios do desenvolvimento.
(Artigo publicado na edição de hoje do jornal Correio Braziliense com cortes)

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