Urbanidade em desuso



SCLN 116: baixo índice de urbanidad
Rosane Garcia

Hoje, pela manhã, fui ao escritório de um amigo na 116 Norte para tratar de uns probleminhas. Procurei uma vaga para estacionar, e nada de achar. Depois de uns 10 minutos, consegui, finalmente, imprensar o meu carro entre o meio-fio e uma moto esparramada em espaço que caberia um caminhão. Quando chego ao edifício do meu amigo, vi dois carros ocupando quatro vagas. No mesmo instante, veio à mente um elogio impublicável às progenitoras dos motoristas.

Mas, em seguida, pensei: “Que culpa as mães têm? Nenhuma. O exercício da urbanidade, a cada dia, é algo mais incomum. As pessoas se sentem donas de tudo, principalmente, do que é público, de uso comum. Será que elas temem que o carro seja arranhado ou fazem parte do grupo que comprou a habilitação em uma cidadela do interior, onde a lei é apenas algo do qual se ouviu falar?”. 

Já no escritório, comentei com o amigo o que havia ocorrido. Enquanto conversávamos, a imagem de dois carros ocupando quatro vagas entrecortava meu raciocínio e, por algumas vezes, me  perdi no diálogo. Aquilo me deixou inquieta. Pedi ao amigo para usar o computador dele e produzir um bilhetinho e fixá-lo no limpador do parabrisa dos carros. Ele riu, e respondeu-me: “Fique à vontade. Também já pensei em fazer algo assim, mas, atolado em tanto trabalho, acabo esquecendo”. 

Sentei-me diante do computador e escrevi: “Não faça ao outro aquilo que você não deseja para si. Tenha urbanidade. Não ocupe duas vagas. Permita que outras pessoas estacionem. Elas precisam tanto quanto você. Um bom dia e muitas alegrias”. Desci, rapidamente, e fiz o que intencionava: coloquei um bilhete em cada automóvel, e voltei ao escritório do meu amigo.Conversei mais um pouco, acertamos o que era necessário e fui embora. 

Por ironia, quando chego à calçada do prédio,  vejo um rapaz, que conduzia o carro de uma empresa, com sede no mesmo edifício, falando com uma moça muito bonitinha, condutora de um dos veículos que ocupavam duas vagas. Ele, educadamente, sugeriu que ela não fizesse mais aquilo, pois estava ali há alguns minutos esperando um espaço para estacionar. Ela replicou com rispidez, pegou o bilhete que eu havia colocado sobre o vidro do carro e saiu em alta velocidade. Em segundos, voltou , parou o carro atrás do que era conduzido pelo rapaz, escreveu algo no bilhete e o colocou no parabrisa do automóvel dele.

Quando vi a cena ao me aproximar do meu carro, decidi voltar, e cedi à curiosidade de ler o que ela havia escrito e pregado no vidro do veículo do jovem. Com uma caligrafia feia, reflexo, talvez, do desequilíbrio emocional, ela agregou ao bilhete a seguinte resposta: “Seu idiota, aqui nunca tem vaga”. Assim que ela partiu, tratei de retirar o papel dali. Ele não merecia ler aquela agressão, afinal, fui eu quem havia provocado a ira da mocinha.

Conclui que a jovenzinha não só era grosseira, mas que tinha princípios de educação e inteligência rasos. Ora, se admitia que ali nunca houvesse vaga, o mais lógico seria usar somente uma, como sugere a boa regra da urbanidade.

Comentários

Marcelo Abreu disse…
bela crônica urbana,Rosane.Gostei muito.A humanidade está doente, minha amiga. beijo

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