Insaciável ganância

As advertências da natureza têm sido ignoradas pelos gestores do Estado. Os detentores do poder de administrar e impor leis das cidades, estados e países viraram as costas aos alertas de cientistas, climatologistas e ambientalistas: o planeta reage, provocado pela destruição das ações humanas, movidas pela ganância sem limite.  Hoje, quando acordei, busquei informações sobre a gigantesca tragédia que arrasa o Rio Grande do Sul. Nessa procura, deparei-me com uma reportagem sobre as alterações na legislação ambiental do estado, facilitando, em resumo, intervenções inadequadas nos ecossistemas gaúchos. 

A versão original do O Código Ambiental do estado foi construída com a participação de José Lutzenberger, uma das maiores referências em ecologia no Brasil, e tornou o Rio Grande do Sul um modelo de preservação do potencial do patrimônio natural para outras unidades da Federação. Mas a norma não agradou o governador Eduardo Leite, que propôs mudanças, que fragilizaram os ecossistemas locais. As alterações provocaram impactos violentos no patrimônio natural gaúcho, modificando ecossistemas e favorecendo interesses do capital.

Objetivos políticos e financeiros individuais ou de grupos, a fim de acumular riqueza, dinheiro e poder, são basilares nas intervenções na natureza. O planeta clama e adverte que é preciso mudar a relação humana com ele, pois a vida está ameaçada. Parece ser um detalhe desprezível. Os alertas de fragilidade seguem negligenciados e ignorados peloBrasil e por grande parte do mundo. Assim, perdem-se os valores que deveriam diferenciar os humanos dos demais seres do planeta. 

Enquanto os seres viventes na Terra lutam para preservar seus iguais, os humanos caminham na contramão. São autores ou protagonistas de normas, comportamentos e ações que resultam na eliminação de pessoas. Pouco importam os danos que sinalizam o extermínio de grupos, comunidades, cidades. Os direitos humanos tornam-se aberração, e só valem para a individualidade. Valores civilizatórios perderam conteúdo, entre eles empatia e respeito, e passaram a ser entendidos como avanço do poder financeiro e político pessoal.  O "homus sapiens" — o "homem sábio", dotado de cérebro desenvolvido, com capacidade cognitiva — transformou-se em "homo degradandis", dissociado do meio ambiente em que vive e se procria. Uma inversão absolutamente ilógica, quando a vida humana é dependente do equilíbrio da natureza. 

Pessoas assim são pautadas em inverdades e no negacionismo radical dos avisos da ciência, apimentados pelas redes sociais que veiculam fake news, estimulando as irresponsabilidades com o planeta. Vale a liberdade de dizimar a natureza: os mares, as matas, as florestas, os animais, poluir o ar e tantas outras agressões. Amparam-se na certeza de que todos os seres não humanos não fazem passeata, não empunham cartazes, não gritam palavras de ordem e, o melhor de tudo, não têm título de eleitor.

Mas a natureza tem capacidade de reação. O drama vivenciado pelos gaúchos, pelas secas no Pantanal, pela redução da oferta de água potável, sem qual a vida se esvai, pelos terremotos e tantos outros fenômenos climáticos com alto potencial de letalidade têm um autor conhecido como ser humano, movido pela sua insaciável ganância.

Rosane Garcia


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