Escravidão contemporânea mantém viva a luta de Zumbi

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Hoje, quando relembramos a coragem e a luta de Zumbi dos Palmares contra a escravidão dos negros, sequestrados pelos colonizadores em várias regiões do continente africano, a homenagem está contaminada pela frustração de constatarmos que, em pleno século 21, há segmentos da economia nacional desprovidos de respeito e humanidade com os que vivem em situação de penúria nas cidades ou no meio rural.

Desde 1995, quando teve início a fiscalização do trabalho análogo à escravidão, mais de 65 mil pessoas foram resgatadas pelas equipes de auditores-fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego. A exploração hedionda da mão de obra dos que vivem em situação de miséria decorre da perversa combinação de ganância e desumanização de seus iguais, depreciados devido à cor da pele e à manutenção dos padrões feudais. Mais de 80% dos escravos contemporâneos, resgatados pelos auditores-fiscais, são negros. 

Mais de um século depois da abolição da escravidão (135 anos), os empresários e patrões ignoram a Constituição de 1988, a legislação trabalhista e, propositalmente, os direitos humanos. Adolescentes, adultos e idosos têm sido vítimas dessa aberração no país. Na lista de atualização semestral, entre 2020 e 2025, foram resgatados 1.530 trabalhadores, a maioria deles explorados em pecuária de corte, cultivo agrícola e serviços domésticos. 

Na última atualização do cadastro de empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravo, em outubro deste ano, 685 empregadores foram autuados e inseridos na Lista Suja do Trabalho Escravo. O maior número de resgatados em 2024 foi em Minas Gerais, com 500 trabalhadores, seguido de São Paulo, com 46, e da Bahia, com 198. No Distrito Federal, foram libertados 29 trabalhadores em condições degradantes — 23 em uma granja e seis em depósitos de carvão.

As punições financeiras e de privação da liberdade, fixadas pelos tribunais, têm sido insuficientes para inibir essa modalidade de exploração. O Brasil foi um dos últimos países da América do Sul a romper com o trabalho escravo, em 1888, por meio da Lei Áurea, assinada pela princesa Isabel, que não previu nenhuma reparação aos negros escravizados. 

Em mensagem ao Correio, o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, avalia que, a partir da última reforma trabalhista e a liberação exacerbada e generalizada da terceirização e, mais recentemente, do que se chama pejotização,  deu-se início um processo que produz a precariedade dos elos de produção. Todos dessa cadeia buscam ter lucro, o que culmina no trabalho análogo à escravidão. "Nós precisamos que a sociedade ajude, porque finalizar com isso não é só um trabalho de governo, do Ministério de Trabalho e Emprego, é de toda a população, de toda a sociedade".

Denunciar a exploração de pessoas vulneráveis é um ato de cidadania, de respeito à vida, de combate à violência e às deprimentes injustiças sociais que envergonham o país.

[Editorial, Correio Braziliense, 20/11/2025]


 

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