Paz e respeito por um Brasil melhor

Fonte: internet | Extrema-direta invade o Congresso e pede intervenção militar contra a democracia

Em 31 de março de 1964 — 60 anos atrás —, o Brasil mergulhou na ditadura militar. Por mais de duas décadas, prevaleceu o obscurantismo. O país perdeu o viço e o brilho do azul, do verde e do amarelo, e passou a vivenciar o luto, a amargura e uma tristeza profunda. Faltava-lhe liberdade e sobrava violência aos opositores do Estado de opressão. O estadista britânico Winston Churchill, morto em 1965, foi taxativo: "A democracia é o pior dos regimes políticos, mas não há nenhum sistema melhor que ela".

Em 8 de janeiro de 2023, incitados pelo ódio e ardente anseio de ressuscitar os piores tempos da República, centenas de brasileiros, capitaneados pelos contrários à democracia, tentaram um golpe de Estado. Invadiram a Esplanada dos Ministérios e vandalizaram as sedes dos Três Poderes — Palácio do Planalto, Congresso Nacional e Supremo Tribunal Federal. Estavam certos de que teriam o apoio das Forças Armadas e, assim, conseguiriam esgarçar a democracia. Dessa vez, não tiveram a plena anuência dos militares, das igrejas e muito menos da maioria dos brasileiros, que desfrutam das liberdades e de direitos cidadãos recuperados há 35 anos e amalgamados pela Constituição de 1988. A investida brutal de abolição da democracia foi frustrada.

Um ano depois da tentativa de golpe, o Brasil ainda vive dividido. Mas é preciso cicatrizar as feridas dos antidemocratas e defensores da perenidade dos valores civilizatórios que tornaram a Constituição de 1988 uma Carta Cidadã, como foi batizada pelo então deputado Ulysses Guimarães. A Lei Maior impactou a sociedade que, na época, também estava dividida. O bom senso, o respeito e a convicção de que o regime anterior era nocivo prevaleceram. Sem saber, eles seguiram o conceito do jurista Ayres Britto, ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, explicitado em entrevista ao Correio Braziliense (31/12/2023): "Democracia é o regime que mais incentiva a formação de consensos".

Os constituintes dos mais diferentes matizes ideológicos abriram mão de seus interesses pessoais e de grupos em favor da reconstrução de um Brasil democrático, respeitoso, carente de justiça social e econômica. Reconheceram a importância da igualdade ante a diversidade étnica, de gênero, de origem, religiosa, política — elementos que sempre deram singularidade ao perfil do país, entre todas as nações. Admitiram, ainda que inconscientemente, que "fora da democracia só existe uma coisa: a barbárie", como afirmou o ministro Ayres Britto.

A incivilidade não cabe no Brasil do século 21, mesmo com todas as suas mazelas sociais e econômicas. As deficiências impõem aos poderes republicanos e a todas as forças vivas da sociedade encontrar soluções para romper as barreiras ao desenvolvimento econômico, a mais igualdade e equidade. Para isso, é essencial que os Três Poderes, respeitados os limites de sua independência, sejam harmônicos no enfrentamento dos desafios colocados à nação. As divergências de qualquer natureza, sobretudo as políticas e ideológicas, não podem instigar a divisão violenta, que leva os cidadãos aos atos extremos.

Espera-se que o trágico e vergonhoso episódio de 8 de janeiro de 2023 jamais seja repetido. Cabe ao Executivo, ao Legislativo e ao Judiciário expressar, por meio de exemplos, a repulsa aos valores antidemocráticos, aspirando do ar o ódio que contamina a atmosfera do país. Paz, harmonia e empenho incansável na construção de um Brasil melhor são tudo que a sociedade brasileira espera dos que ocupam os Poderes da República.

[Editorial de 6 de janeiro de 2024, Correio Braziliense]

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