No Brasil ou nos EUA, os negros são alvo da polícia



Estou acompanhando a onda de manifestações dos norte-americanos devido ao inominável e cruel assassinato do afro-americano George Floyd, pelo policial Derek Chauvin de Minneapolis. Confesso que sinto inveja da capacidade protestos dos negros de lá. Hoje, eles contam com apoio de brancos, como mostram as imagens das emissoras de tevê. Sinto inveja de como a imprensa brasileira abre espaço para essas reações dos americanos. 
Os comentaristas brasileiros, jornalistas reconhecidos, dão um tom inconformismo diante da atrocidade da polícia racista dos Estados Unidas. George Floyd não será o último negro esmagado pelo coturno de um policial branco. Quem é negro tem consciência de que cenas semelhantes se repetirão. Os valores civilizatórios do século 17 ainda estão presentes em pleno século 21, seja na maior economia e potência planetária, seja no atual Brasil, hoje dominado, mais uma vez, pelo verde-oliva. A cor da pele ainda é determinante para a depreciação das pessoas. 
A minha inveja é motivada pela alienação do negro brasileiro, pelo desengajamento da imprensa em relação às atrocidades que ocorrem neste país com os não brancos. A brutalidade das forças de segurança no Brasil contra os negros está na mesma dimensão dos policiais brancos dos Estados Unidos. Mas isso não merece páginas nos jornais nem horas de transmissão pelas nas emissoras de televisão. 
Aqui, como nos Estados Unidos, predomina o estigma de qualquer homem ou mulher de pele preta é bandido, prostituta, ladra, traficante, aviãozinho do narcotráfico, estuprador, latrocida. É um ser imprestável, cujo assassinato pelo Estado não faz a menor diferença. A maioria dos negros não é bandida. 

Em 2018, foram registradas 57.341 mortes violentas no país — 10.8% menos do que no ano anterior. A violência policial fez 6.220 vítimas: 99,3% foram homens, sendo 77,9%, entre 15 e 29 anos. Os negros somaram 75,4% do total de homens mortos pelas forças de segurança pública, um aumento de 19,6% na comparação com 2017, segundo do 13º Relatório do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).

O estudo mostra que epidemia do machismo aumentou em 4% o número de vítimas. Foram mortas 1.206 mulheres, 61% delas eram negras. A maioria delas (58%) tinha entre 20 e 39 anos. A cada dois minutos uma mulher foi vítima de violência doméstica. Em 2018, 263.067 mulheres sofreram lesão corporal dolosa. A brutalidade masculina fez 66.041 vítimas de estupro — 180 casos por dia: 53,8% eram crianças até 13 anos, ou seja, quatro meninas, a cada uma hora, foram estupradas. As mulheres negras (50,9%) foram as mais violentadas.
Diante de tanta violência, lamentável que a parcela majoritária dos afro-brasileiros não se enxergue como povo. Desconhece a sua real origem. Ignora a saga de horror imposta aos seus antepassados, devido ao racismo estrutural, implantado pelos colonizadores. Durante séculos, foram fortificadas as barreiras à educação dos afrodescendentes. E, propositadamente, deturpada a história dos africanos no Brasil. A ignorância nutre a baixa estima de pretos e pardos. Fortalece a discriminação e o preconceito ainda dominantes no país.
As mudanças são lentas. Aqui ou acolá, pequenos grupos e comunidades se insurgem contra a realidade que aparta os negros dos benefícios — ainda que poucos — do desenvolvimento do país. Mas a maioria dos movimentos não merece os holofotes dos veículos de comunicação dominados pelos não negros. Os negros precisam aprender a reagir aos infames tratamento que recebem do poder público e que contamina todos os setores da sociedade. Até que isso ocorra, seremos estigmatizados e mortificados a cada segundo.

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