Uma chance para o ECA

Rosane Garcia



Oito dias atrás, Planaltina ficou estarrecida com a morte do professor Guilherme Barbosa, 28 anos, em plena praça pública. Ele resistiu a uma tentativa de assalto por dois meninos, de 11 e 14 anos, quando se exercitava em um Ponto de Encontro Comunitário (PEC). No embate com os garotos, o professor foi morto com um tiro na nuca. Em janeiro último, um militar reformado de 66 anos não resistiu a um tiro cabeça disparado por um adolescente de 16 anos, durante um assalto.

Os episódios apenas ilustram a participação cotidiana de crianças e adolescentes no aumento da violência urbana. Homicídios, latrocínio, assaltos, estupros, narcotráfico… Eles praticam quase todas as modalidades de crimes. No ano passado, os menores de 18 anos foram responsáveis por 33% dos crimes contra o patrimônio, e por 29% dos 517 assassinatos ocorridos de janeiro a setembro. No fim do mês passado, a polícia apreendeu 40 jovens por diferentes infrações penais.


Essa contribuição infantojuvenil aos índices alarmantes de violência reforça o discurso dos que defendem a redução da maioridade penal, a fim de impor às crianças e aos adolescentes punições idênticas às aplicadas aos adultos. Eles tomam como exemplo os modelos de países ditos desenvolvidos, nos quais as sanções ignoram as faixas etárias. Para esses grupos, vale perguntar: Será que penas mais rigorosas vão inibir as práticas dolosas de crianças e adolescente? Mas antes de responder à questão, não seria o caso de avaliar o que levou esses jovens a ingressarem na tortuosa trajetória do crime?


Vivemos em país ainda profundamente marcado pelas injustiças sociais e econômicas. Rico em legislação avançada, mas extremamente miserável quanto à aplicação das normas que eliminam as desigualdades. Entre as causas, a corrupção e o descompromisso das autoridades com o coletivo. Sobra pouco ou quase nada para a elaboração e a execução de políticas públicas para os jovens.


Eles estão nas ruas, diante dos olhos das autoridades, e nada é feito para garantir que tenham uma vida digna, com educação, saúde, lazer, cultura... Reduzir a maioridade penal talvez, mais do que punir, seja uma maneira de esconder as incômodas imagens da drogadição jovens, de garotos e garotas algemados e tantas outras de situações desagradáveis. 


Esse álbum de fotografias, sem retoques, comprova o fracasso do Estado diante das exigências estabelecidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que, em julho próximo, completa 24 anos. Ou seja, o país não teve chance de provar que proposta de ressocialização do ECA é ineficaz, como tentam fazer crer aqueles que querem mudar a norma. O desafio aos futuros governantes está colocado. É preciso dar uma oportunidade ao estatuto, sobretudo, aos jovens que erraram e não antecipar a fase adulta deles em cadeias ou reformatórios que fortalecem os defeitos em vez das virtudes.

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