Faltam muitas respostas

Rosane Garcia
O depoimento do tenente-coronel reformado Paulo Malhães à Comissão da Verdade não surpreendeu as pessoas que tiveram filhos, irmãos, amigos vitimados pela brutalidade do regime de exceção, resultado do golpe de 1964. Aos 76 anos, o militar rompeu parte da blindagem que, ainda hoje, impede a sociedade brasileira de conhecer em detalhes 21 anos da história do país. Ele admitiu a tortura, a execução e o desaparecimento de pessoas que se opunham à ditadura militar. Onde estão os desaparecidos? Essa indagação persiste e provoca um enorme incômodo às Forças Armadas, que preferem o silêncio ou frágeis argumentos para justificar o imponderável. Centenas de famílias ainda esperam uma resposta do Estado.

Todas as iniciativas — procura das ossadas na região do Araguaia, reparação pecuniária aos que escaparam com vida (mas não ilesos de danos), instalação de comissões de investigações e outras — não foram satisfatórias. É indelével a dor, a marca da perda de um filho, apenas porque ele tinha convicções diferentes dos autoritários. Nada, absolutamente nada, ampara a violência do Estado brasileiro sobre aqueles que se insurgiram contra o regime. Ao poder público, sustentado pela sociedade, não é dado o "poder" de decidir sobre a vida e a morte de homens e mulheres de um país.

O coronel reformado revelou que o poder obscurantista mantinha uma Casa da Morte, sustentada com recursos dos trabalhadores brasileiros, pessoas em constante risco de serem vítimas da truculência do regime. Lá, em Petrópolis, cidade serrana do Rio de Janeiro, que abriga os descendentes do período imperial, estava a maldita residência, utilizada pelo Exército, de 1971 a 1978, para transformar homens e mulheres em massa putrefata, irreconhecível — os desaparecidos para sempre. Quem eram essas pessoas? Onde elas estão? Será necessário esperar mais 50 anos do hediondo golpe de 64 para se ter respostas para essas e tantas outras indagações?

Lamentável que os comandantes das forças militares não tenham alcançado o estado democrático de direito. Eles mantêm trancafiados, sob muralhas do sigilo, todos os arquivos capazes de responder definitivamente as inúmeras perguntas da sociedade. Enquanto isso, as comissões da verdade seguem tateando e montando um gigantesco quebra-cabeça a fim escrever 21 anos de uma história de tragédias, de supressão das liberdades individuais que enlutaram e envergonharam o país. 
(Artigo publicado na edição de hoje (29/3) do jornal Correio Braziliense)

Comentários

Postagens mais visitadas