Enem é desafio para jovens e governo

 Os dois próximos domingos (3 e 10 de novembro) serão desafiadores para os 4,3 milhões de jovens inscritos no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e também para o governo federal, que criou o programa Pé-de-Meia com o intuito de manter os jovens e adultos, entre 14 e 24 anos, no banco escolar para que concluam o ensino médio e cheguem a uma cadeira nas universidades.

Lançado em março deste ano, o programa de incentivo financeiro atende a cerca de 4 milhões brasileiros que cumprem as seguintes exigências: ser matriculado em escola pública ou no Educação para Jovens e Adultos (EJA), integrar família inscrita no Cadastro Único (CadÚnico), comprovar frequência escolar mínima de 80%, ter aprovação na conclusão do ano letivo e participar dos exames obrigatórios. Por sua vez, o Enem, criado em 1998, tem, entre os desafios atuais, reduzir o alto número de candidatos que não vão fazer a prova. 

Agora, o Pé-de-Meia também começará a ser testado. Garantir R$ 200 aos que comparecem ao Enem e manter uma poupança que pode render aos estudantes, após os três anos do ensino médio, mais de R$ 9 mil são benefícios capazes de conter a evasão escolar e a abstenção a cada edição do exame?

Na análise da Todos pela Educação (TPE), uma organização da sociedade civil, o programa governamental é bastante relevante, com grande potencial de impacto, mas não pode ser compreendido como solução para os problemas do ensino médio. Para a entidade, a escola tem de ser atraente, acolhedora, a fim de que os jovens  a percebam como elemento que permitirá a concretização do seu projeto de vida. Ao mesmo tempo, é indispensável um olhar aos profissionais de educação, que demandam melhores condições de trabalho, integração entre educação e tecnologia, melhoria da infraestrutura física e digital das unidades de ensino, bem como ampliação das escolas de tempo integral.

Reduzir ou eliminar os índices de abstenção do Enem é um dos desafios da nova política de educação. O percentual variou entre 27% e 34% desde 2010. Em 2020, em meio à pandemia da covid-19, 55% dos inscritos faltaram ao exame. Ano passado, a abstenção chegou a 32%.

A evasão e a abstenção também têm relação com a falta de motivação dos estudantes, a desconexão entre o currículo e a realidade do aluno, dificuldade financeira, problemas familiares, o ambiente doméstico instável, gravidez precoce, bullying e outras manifestações de violência são fatores que dificultam o aprendizado, dentro e fora da escola, e acabam levando a juventude ao abandono escolar. Trata-se de um ciclo que se repete, alimenta a injustiça social e econômica tangível no país e impacta significativamente na realidade das novas gerações.

Ainda que o Pé-de-Meia seja bem-sucedido, com redução drástica dos índices de evasão escolar no ensino médio e da abstenção no Enem, há o desafio de traçar iniciativas que permitam aos ingressantes das universidades terem condições adequadas para concluir o aprendizado — o índice de estudantes que abandonam a educação superior no Brasil chega a 57,2% entre redes pública, privada e ensino presencial e a distância (EaD), segundo o Mapa do Ensino Superior no Brasil 2024, do Instituto Semesp. Os obstáculos que levam muitos jovens a largarem os estudos estão visceralmente associados às desigualdades sociais e econômicas de expressiva parcela da sociedade.

[Editorial, Correio Braziliense, 24/10/2024, revisado]


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