Saúde pública: protocolo contra a transparência

 As doulas — mulheres que acompanham as gestantes antes, durante e após o parto — e as parteiras até então descartadas, mais recentemente, voltaram à cena da saúde pública, apesar da contrariedade dos hospitais e de grande parte dos profissionais. As justificativas são rasteiras e estão umbilicalmente ligadas aos aspectos financeiros. Há pouco tempo, uma colega de trabalho engravidou aos 25 anos e desejava fazer parto normal. A médica que fez o pré-natal foi clara e objetiva: embora ela reunisse todas as condições físicas, o parto seria cesáreo, por uma questão de economia de tempo. O parto normal poderia durar horas ou até mais de um dia, o que significaria prejuízo, frente ao valor pago pelo Sistema Único de Saúde. Além disso, reduziria a possibilidade de ganho do hospital, que teria de dispor de um leito por um período mais longo para apenas uma paciente.

Hoje, no entanto, li um artigo que torna ainda mais sórdidas as ponderações de profissionais e estabelecimentos hospitalares. A doula é uma figura inconveniente na sala de parto, pois ela pode ser a testemunha de procedimentos inadequados com a parturiente, com o recém-nascido. E quem quer uma testemunha contra si? Obviamente, ninguém. 

Esse comportamento destoa da orientação do sistema, que propugna pelo parto normal. Mas entre os gabinetes dos órgãos federais e os consultórios, há uma distância abissal. Esse é apenas um exemplo que os permite passear pela manchete de dois dias atrás do Correio Braziliense: de 1.072 processos contra profissionais da saúde, dois resultaram em punições pelo Conselho Regional de Medicina. Não há exagero concluir que prevaleceu o corporativismo, a falta de transparência e, possivelmente, a tão comum impunidade por interesses outros que agem em direção oposta a do bem-estar coletivo e da prestação adequada dos serviços. Será que médica que determinou a aplicação de uma overdose de adrenalina em uma menina, moradora da Cidade Ocidental, vai compor mais uma página no livro da impunidade?

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